Praticamente um ano se passou quando resolvemos fazer um manifesto a favor do consumo de glúten por pessoas que não tem a doença celíaca (leia aqui) e cá estamos nós de novo para falar deste tão temido composto alimentar.
O motivo que me traz de volta a este assunto é muito simples. Nós, aqui do Batata Frita, lemos três reportagens interessantes que falavam sobre a temática da dieta glúten-free. Em duas delas, mais voltadas ao valor nutricional destas práticas alimentares, víamos que existia uma clara tendência em incentivar as pessoas a, talvez, não excluir o glúten de maneira tão radical e precoce da sua alimentação. As alegações eram várias, que passavam da baixa ingestão de fibras em uma dieta sem os alimentos fonte desta proteína, quanto a baixa qualidade nutricional de uma rotina alimentar sem glúten. Na outra reportagem, da revista The Economist, fomos apresentados ao significante aumento do faturamento da indústria alimentícia após o “boom” das dietas sem glúten: o crescimento desta fatia do mercado chegava a 45% de 2011 a 2013, com faturamentos anuais de 15 bilhões de dólares.
Diante destes fatos eu ainda quero lhe perguntar: será que retirar o glúten da dieta é uma ação motivada por estudos clínicos, ou por uma necessidade do mercado em se reinventar?
Não preciso reforçar aqui o quanto eu julgo importante para a nossa alimentação a ingestão do trigo e de outros alimentos que contém o glúten em sua composição, já que quem nos acompanha sabe direitinho qual é o nosso posicionamento sobre o assunto. Não preciso também dizer que a dieta glúten-free, realizada por pacientes celíacos, não precisa ser deficiente em nutrientes ou valor nutricional, já que hoje, além das alternativas industrializadas sem a proteína, é possível fazer substituições saudáveis que permitem que estes indivíduos tenham uma vida perfeitamente normal. Então porque estamos nos debatendo e protestando contra a prática da dieta glúten-free por indivíduos saudáveis? A resposta para mim (que já estava muito clara na minha cabeça), veio após a leitura destas reportagens.
Nós somos verdadeiras marionetes da indústria alimentícia. Nas últimas três décadas esta tendência só se torna ainda maior. Queremos saber cada vez mais sobre o que faz bem, o que faz mal, o que emagrece, o que dá câncer, o que engorda e o que mata. Por isto dietas da moda fazem tanto sucesso, livros sobre alimentação vendem tanto e produtos da seção diet dos supermercados são os mais caros e mais procurados. A indústria entende muito bem esta demanda e necessidade, e sabe muito bem trabalhar a clientela que tem. Não é suspeito o glúten, que antes era um nutriente como outro qualquer, de repente virar o maior vilão da nossa alimentação? E assim, repentinamente, surgirem tantas alternativas industrializadas para que ele pudesse ser excluído da nossa alimentação? As estatísticas do mercado consumidor são bem claras sobre a procura destes produtos, que é muito maior em grupos de pessoas saudáveis do que por quem tem a doença celíaca. E é esta procura que justifica o grande faturamento do mercado.
Tirar o glúten não vai te fazer mais magro ou mais saudável, mas com certeza vai deixar os bolsos dos produtores destes alimentos ainda muito mais cheios. Você sabia que os produtos sem glúten hoje são mais procurados do que os vegetarianos? Pois é. Talvez tenha chegado a hora de começarmos a rever nossos conceitos em relação a estes alimentos. Quem sabe falando sobre o que dói no bolso chame mais a atenção do que a importância nutricional deste composto alimentar? Quem sabe diminuindo a nossa demanda por estes produtos (desnecessários) para pessoas sem a doença celíaca, conseguimos forçar o mercado para baratear os preços para quem realmente precisa adquirir estes alimentos? Queridos leitores, não deixem de refletir sobre o que estamos falando há mais de um ano, mas se vocês ainda não confiam 100% na nossa opinião não tem problema, é só não deixar de acreditar que a indústria alimentícia não está tão preocupada assim com o seu bem estar como parece.