Leitura na Cozinha : A Mistura da São João (Revista Gula – Janeiro de 2000)

Vários parentes meus estão envolvidos com a literatura. Resolvi tomar um destes textos emprestados (sem pedir licença, já que ele havia sido previamente publicado). Trata-se de uma crônica, publicada pelo meu tio Klaus Kleber, jornalista conhecido de São Paulo (Gazeta Mercantil, Estado de São Paulo), em uma revista que era um dos bastiões da boa gastronomia: Gula. Deliciem-se, especialmente os paulistanos

A mistura da São João

Klaus Kleber

Da tailandesa à goiana, cozinhas de todo o mundo podem ser encontradas em São Paulo. Mas experimente procurar na cidade – que no próximo dia 25 de janeiro completa 446 anos – um restaurante de comida paulista. Não há. Muitos bares e restaurantes se autodenominam paulista ou paulistano, mas isto é apenas uma referência geográfica. A autêntica comida paulista é a mistura, termo de forte conteúdo gastroemocional na megalópole. Arroz, feijão, macarrão e tudo que de que se necessita para preparar uma pièce de résistence  é uma coisa. Mistura é algo mais.

Nessa especialidade, a Avenida São João continua sendo imbatível. O que se perdeu foi o sabor jovem e conspiratório dos anos 60. Ainda há, para o aperitivo que muitos não dispensam, aqueles botecos apertados, praticamente um balcão com um espaço para três ou quatro pessoas, onde os donos conseguem servir vinte. Mas desapareceu (ou mudou-se) o antológico Rei das Caipirinhas, onde montamos uma trincheira inexpugnável de resistência ao golpe.

Era só uma porta no Anhangabaú que dava para um pequeno cômodo em L, um verdadeiro achado para você se proteger do vento e do frio. Na virada do L, ficava um espaço de 2m x 1,5 m, conhecido pelos defensores da legalidade democrática como jardim de inverno. O Rei oferecia pingas das mais longínquas marcas e uma variedade de misturas: além de limão, tinha Caipirinha de abacaxi, morango, laranja-da-baía, carambola, uva, uvaia e outras frutas da estação. Depois de dar a volta à sede, os cidadãos, mais confortados, tinham à sua frente, ainda na baixa São João, uma fieira de de estabelecimentos conhecidos pela designação global de circuito Quibe. Ali, foi inventado o prato feito (PF) com Esfiha, Quibe ou Cafta. Consta também que uma padaria da São João, à esquerda de quem sobe, foi o laboratório de outra invenção que logo ganhou o mundo: a pizza portuguesa.

Para satisfação de seu paladar castiço, o lusitano ali estabelecido mandou adicionar à mozzarela paio, cebola e azeitonas pretas, mais uns pingos de óleo da marca Galo. O presunto entrou depois, no lugar do paio. Estava criada a celebrada pizza, que transplantada para Portugal é conhecida como brasileira.

O sustento mais frequente era fornecido pela baratíssima Salada Paulista (na Ipiranga), com suas batatas embebidas em maionese mais uma solitária salsicha. O toque de classe era a folhinha de cheiro-verde bem picada em cima da maionese. Um chope geladinho era de rigueur. Nos dias de menos dureza, íamos todos ao bar Brahma da Avenida São João, que nos parecia o melhor que o capitalismo poderia oferecer. O programa dos sonhos da estudantada, jornalistas e escriturários era levar as namoradas para o escurinho da sobreloja do bar. Discretamente o Brahma tinha duas entradas. Pela Avenida Ipiranga, você ia dar no bar propriamente dito, com balcão e banquinhos estofados de couro, na extremidade do qual estava a escada para a sobreloja dos amores. Essa parte romântica era ligada por um corredor, com paredes de lambris, ao barzão e restaurante, um grande salão todo iluminado por imponentes lustres de cristal. Naquele oásis, ao qual se podia ter acesso direto pela Avenida São João, você podia desfrutar, além do schnapps, de um chope que descia bem com um honesto salsichão com batatas, Eisbein com chucrute e iguarias que tais. E tinha a orquestra, composta por dignos músicos profissionais, sempre de smoking, consagrados pela execução de valsas, polcas, xotes e mazrucas. Algumas tão antigas que um amigo meu costumava dizer que as partituras eram compradas no sebo. Mas o piano, o violoncelo e os violinos do Brahma, no vasto salão, não incomodavam. Na verdade, eram um convite para um bom papo. O que é mais do que se pode dizer de tantos barzinhos espremidos e estridentes hoje espalhados por aí.

E você aí de São Paulo, não quer escrever para gente e dizer se alguns desses templos ainda existem ?

Dica de Livro: Sementes nutritivas para um futuro sustentável (Livro de Receitas Gratuito)

Pouca gente sabe, mas o ano de 2016, que está terminando, foi decretado como o  Ano internacional das leguminosas: Sementes nutritivas para um futuro sustentável pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO).

Par marcar  este ano, foi lançado um novo livro ilustrado, que fornece receitas de famosos chefs internacionais, apaixonados por um dos alimentos mais versáteis do mundo: as leguminosas. O livro promove uma visão geral das leguminosas, de como elas beneficiam a nutrição, a saúde, a biodiversidade e a segurança alimentar, além disto o livro explica passo a passo o que deve se buscar na hora de comprá-los, como cultivá-los em casa e a melhor forma de cozinhá-los.

O livro é acompanhado de inúmeros gráficos, fotografias maravilhosas e de várias receitas de refeições com leguminosas no cardápio. E o melhor: o livro é gratuito. É só clicar no link abaixo: (obs. a publicação é em espanhol)

Acesse a obra clicando aqui.

Saiba mais sobre o Ano Internacional das Leguminosas: www.fao.org/pulses-2016/es

Leitura na Cozinha: Vermelho Amargo – Bartolomeu Campos de Queirós.

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Um maravilhoso livro,deste genial escritor mineiro, baseado na sua relação com o tomate, e na saudade da comida da mãe comparado ao amargor da comida da madrasta. Saboreiem este trecho:

Se a chuva chovia mansa o dia inteiro, o amor da mãe se revelava com mais delicadeza. O tempo definia as receitas. Na beira do fogão ela refogava o arroz. O cheiro do alho frito acordava o ar e impacientava o apetite. A couve, ela cortava mais fina que a ponta da agulha que borda mares em ponto cheio. Depois, mexia o angu para casar com a carne moída, salpicada de salsinha, conversando com o caldo de feijão. Tudo denunciava seu amor. Nós, meninos , comíamos devagar, tomando sentido para cada gosto. Ela desconfiava que matar a nossa fome era como nos pedir para viver. A comida descia leve como o andar do gato da minha irmã.”

Alguém já viu melhor descrição de comida de mãe ?

 

Leitura na Cozinha:APRENDIZ DE COZINHEIRO – Bob Spitz

 

A dica de hoje é de um  livro verdadeiramente DELICIOSO. Bob Spitz, após ter terminado de escrever sua badalada biografia dos Beatles, separou-se, levou um passa-fora da nova namorada e resolveu realizar um velho sonho: viajar pela França e Itália, aprendendo a cozinhar com grandes chefes, em restaurantes famosos e em Escolas de Culinária. O resultado é um livro recheado de boas histórias, contados em uma prosa agradável e complementados por algumas receitas realmente preciosas (já experimentamos e publicamos algumas aqui no Batata). Pode devorar ! Vale a pena!

Livro: Regras da Comida – Michael Pollan

A partir deste post, o nosso blog vai analisar detalhadamente um livro delicioso de Michael Pollan, jornalista americano, especialista em assuntos e reportagens sobre alimentação. Neste livrinho, extremamente divertido, Pollan lista 64 regras simples para nos ajudar alimentar. Nossa proposta é comentar cada uma delas, com embasamento científico, de modo que ao final das publicações, de uma maneira divertida, possamos ter alguma ideia de como nos alimentarmos melhor.

O livro foi publicado em 2009, o que não tira a sua atualidade e já me conquistou a partir da dedicatória:

“À minha mãe, que sempre soube que manteiga era mais saudável que margarina.”

Pollan pondera que comer virou uma coisa complicada, de tal modo que muita gente já começa a depender de especialistas, para saber como comer. Um absurdo ! Comer é um ato fisiológico, aprendido e passado de uma geração a outra, e provavelmente você vai ouvir conselhos melhores de sua mãe ou de sua avó do que de um especialista. Outro fato sinistro, salientado por Pollan é a quantidade de pessoas hoje familiarizados com termos bioquímicos, relativamente complexos, como antioxidantes, gordura saturada, ácidos-graxos ômega 3 , carboidratos, polifenóis, glúten, probióticos, como se eles fossem facilmente compreensíveis e que o conhecimento, ou não, de sua existência pudesse ser absolutamente essencial para você se alimentar bem.

Comer bem é simples e como diz Pollan, pode ser resumido em apenas sete palavras:

“Coma comida. Não em excesso.Principalmente vegetais”

O post de estreia da série será a regra número 1: Coma comida ! Aguardem

Depois de culpar o açúcar, será que a gordura enfim pode?

Uma das principais vantagens dos tempos atuais é a velocidade em que a informação é transmitida e como essa mesma informação é capaz de estar certa em um minuto, e totalmente errada em outro.

Acaba de ser lançado nos EUA um livro bem polêmico (no mínimo) para boa parte nutricionistas, nutrólogos e simpatizantes da comida saudável. Escrito pela jornalista Nina Teicholz, o livro “The Big Fat Surprise: Why Butter, Meat and Cheese Belong in a Healthy Diet.”, vai bagunçar boa parte das recomendações nutricionais (convencionais) que conhecemos sobre o consumo de gorduras saturadas.

Livro: The Big Fat Surprise
Livro: The Big Fat Surprise

A proposta de Nina é bastante interessante e a discussão sobre o assunto não se limita a apenas um debate de nutricionistas. Nina vai além e investiga centenas de artigos científicos e aponta (juntamente com outros pesquisadores) as possíveis falhas metodológicas realizadas durantes as pesquisas para descobrir o porquê, afinal, criminalizaram o uso das gorduras e como isso modificou a forma que as indústrias de alimentos trabalham, o que as pessoas comem e o tempo que elas vivem.

O uso das gorduras na nossa dieta sempre foi relacionado aos possíveis danos que poderiam causar na nossa saúde, principalmente aqueles ligados as doenças cardíacas, principal causa de morte em vários países do mundo.  De acordo com o American Heart Association (AHA) principal órgão mundial responsável estudar e publicar as diretrizes médicas sobre o assunto, se comermos comidas com grandes quantidades de gorduras saturadas, possivelmente aumentaríamos o nível de colesterol no nosso sangue, e elevaríamos em grandes chances o risco de termos infartos ou qualquer outra doença do coração.

Sobre o Livro (disponível somente em inglês)
Título:The Big Fat Secret – Why Butter, Meat and Chesse, belong in a healthy diet 
Autor: Nina Teicholz
Editora: Simon & Schuster
Páginas: 479 páginas
Preço: $ 18,88
Disponível em: amazon.com 

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